quarta-feira, 4 de abril de 2012

Um mistério em minha vida


Atendendo a convite da minha colega Valderez Monte, lendária coordenadora do Grupo Móvel do MTE, integrei sua equipe numa ação no sul do Pará, apurando a denúncia de um escravo fugido, o qual declarou à polícia em Fortaleza, que fugira de uma fazenda depois de espancado e saiu vomitando sangue.

Esse trabalhador descreveu inúmeros ilícitos penais que ocorriam naquela propriedade e essa operação era considerada de alto risco para todos nós, tanto, que Valderez só me contou os detalhes da denúncia pessoalmente, quando cheguei ao Pará.

Estávamos acompanhados de uma equipe da TV Globo que se habilitou junto ao MTE, dada a gravidade da denúncia. Já havia decisão do antigo Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado – GERTRAF – de que a imprensa deveria ter acesso às operações, quando solicitasse, porque se tratava de assunto ligado aos direitos humanos e toda a sociedade tinha o direito de saber o que acontecia nessas abordagens.

Valderez comandava a operação e eu ouvia atentamente quando ela questionava o gerente sobre as condutas naquela fazenda.

O gerente então olhou fixamente pra mim e disse:

- A gente já sabia que a Sra. vinha, porque seu pai nos disse que ia trazer a senhora.

- Do que o senhor está falando? Perguntei, espantada, pois meu pai já havia falecido e pensei se ele havia baixado em espírito naquele local. Ele então chamou a sua esposa e perguntou na frente de todo mundo:

- Essa não é a filha de fulano? (referia-se ao denunciante).

- Sim, respondeu a mulher. É ela mesma que estava na foto que ele nos mostrou, dizendo que era a filha dele, que era fiscal do Ministério do Trabalho e que viria libertar ele.

Ficamos espantados, e os colegas riram da situação inusitada.

- Vocês são loucos, disse eu.

- Não, não, é a senhora mesmo. Ele disse até seu nome: Marinalva. A estória era espantosa. Um escravo tem uma filha que é coordenadora do grupo móvel e ela leva uma equipe para fazer justiça ao pai, ex escravo, fugitivo e denunciante.

- Indique para a Rede Globo, falei para o jornalista. É assunto para novela.

Brinquei na hora, mas, até hoje fico pensando por que teria ele inventado aquela estória, se eu nem sequer era coordenadora da operação? Por que não foi com Valderez, que naquela época era a coordenadora dos resgates no Pará? Esse é um mistério que nunca decifrei, já passados 12 anos do estranho episódio, uma vez que não estivemos com o denunciante.

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