Hoje é um singular dia das mães, por coincidir com o dia em que a igreja Católica comemora a aparição de N. Senhora na Cova da Iria.
Também é dia em que completamos 124 anos da abolição da escravatura no Brasil. Esperava que estivéssemos comemorando a aprovação da PEC 438/2001 que trata da expropriação das terras onde foi constatada exploração de trabalho em condições análogas à de escravo.
Tendo sido testemunha das ações de resgate de muitos escravos, presenciei crianças nascidas em cativeiro, em desobediência não só a Lei Áurea, mas a Lei do Ventre Livre.
Os parlamentares que se opõem à aprovação da referida PEC, padecem de déficit humanitário e estão usando de retórica para desviar o foco da triste situação de termos escravos num país de homens livres.
Se tivessem a oportunidade de ler alguns exemplares dos relatórios do grupo Móvel, sequer teriam cogitado em adiar a votação, em passar mais um dia 13 de maio em débito com a cidadania deste país.
Deviam ter visto, como vi, uma criança de um "ventre não livre", vir a este mundo natimorta, logo após resgatarmos sua mãe. Da mesma forma, vi uma criança nascer viva e livre, durante um resgate dos seus pais de situação de trabalho escravo.
Mas, não é exatamente de trabalho escravo que quero falar hoje, e sim de mães. Mães que tive a oportunidade de conhecer por coordenar um núcleo de Promoção da Igualdade no MTE. Nesse núcleo, que chamamos de Pró-Dignidade, lidamos com discriminados no trabalho em razão da sua raça, da sua opção sexual, da sua condição de ser portador do HIV/AIDS. Porém, o assédio que mais tem nos ocupado é o praticado contra as gestantes.
O número de jovens mães que nos procuram para cumprirem em paz sua estabilidade provisória é assustador. Tivemos que criar um turno pela manhã para atendermos prioritariamente a essas trabalhadoras especialíssimas, porque trazem no seu ventre uma criança, que sofre com sua mãe, todos os males do trabalho. Cuidar dessa mãe, significa cuidar do trabalhador mais precoce do mundo, que vai ao trabalho no útero materno.
O tormento das mães começa tão logo elas dão a notícia da sua gravidez. Os empregadores sabem que as mesmas ficarão afastadas por 120 dias e terão estabilidade até cinco meses após o parto. Sabem que elas têm direito a faltar pelo menos uma vez por mês para consultas do pré-natal; que precisam ir mais vezes ao toilete, lanchar em intervalos mais curtos. Que deverá ser transferida de setor se o mesmo for insalubre.
Sabem que ao retornar da Licença à Gestante, a mãe precisará de meia hora em cada turno, para amamentar seu filho, até que esse complete seis meses de idade.
Esses direitos, que na verdade são da criança e não da mãe, não podem ser subtraídos sob nenhum pretexto. O que fazem as empresas, então? Iniciam um movimento para provocar uma das seguintes situações:
1. A mãe desiste da estabilidade no emprego e pede demissão, para gestar seu bebê em paz e com saúde, mas ganha novo sofrimento que é a incerteza de poder prover as necessidades do filho sem o emprego e ainda tem que dar aviso prévio ao empregador, ou ter descontado um mês de salário;
2. A mãe é levada a se desestabilizar, cometendo erros ou se rebelando e caracterizando uma “justa causa”, perdendo direitos.
Essas são as duas únicas hipóteses de rescisão contratual para a empregada gestante: pedido de demissão ou justa causa.
Os métodos são os mais variados: exigências diferenciadas em relação aos demais colegas, rigidez no tratamento, intolerância, humilhações, cortes de gratificações, supressão de direitos, diminuição do intervalo para descanso, cerceamento para usar o sanitário, jornada excessiva, cortes no Vale-Transporte, recusa dos atestados médicos com desconto dos dias faltados, tarefas incompatíveis com a condição de grávida, como subir constantemente escadas, agachamentos, pesos, etc.
O pior de tudo é a cumplicidade dos próprios colegas, que praticam o assédio horizontal, excluindo ou isolando a gestante, para não desagradar o patrão.
Por tudo isso, minha homenagem hoje vai para essas mães, cujo número posso dizer que é enorme, e que precisam de um olhar mais atento e humanitário não só dos empregadores, mas dos colegas de trabalho, dos sindicatos, dos auditores-fiscais do trabalho, e dos procuradores do trabalho, para que no próximo ano, muitas dessas mulheres que hoje estão sendo vítimas desse aviltante assédio, possam comemorar o dia das mães empregadas, com paz, e dignidade.
Marinalva Cardoso Dantas
13.05.2012
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